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Grupo saudita oferece R$ 30 milhões por casco de porta-avião, e Marinha adia afundamento

 

Divulgação / Marinha do Brasil 

O grupo empresarial Sela, da Arábia Saudita, entrou em contato com a Marinha brasileira para apresentar uma oferta para a compra do casco do porta-aviões São Paulo. A proposta foi feita na segunda-feira (30), após o jornal Folha de S.Paulo revelar que a Marinha planejava afundar a embarcação diante do avançado grau de degradação do antigo aeródromo.

O grupo saudita oferece cerca de R$ 30 milhões para a aquisição do casco -valor três vezes maior que o feito pelo estaleiro turco Sök Denizcilik and Ticaret Limited.

A companhia turca chegou a assinar o contrato de aquisição com a Marinha, mas decidiu devolver o porta-aviões após a Turquia vetar a entrada da embarcação em seu território.

Com a proposta, a Marinha decidiu adiar o afundamento do casco, que estava previsto para ocorrer na quarta-feira (1º). Fontes militares não descartam a possibilidade de a embarcação naufragar de forma involuntária, já que as condições de flutuabilidade do navio estão péssimas.

"Na qualidade de procuradores do grupo Sela da Arábia Saudita manifestamos interesse em comprar o casco da antiga embarcação ex-NaE São Paulo, assumindo assim todo e qualquer custo operacional com eventuais reparos estruturais e retirada de resíduos tóxicos", escreveu o advogado Alex Christo Bahov, contratado para representar os sauditas na negociação, em email para a Marinha.

"O grupo Sela está ciente dos problemas e elevados custos envolvendo o casco da antiga embarcação ex-NaE São Paulo, destinação final para estaleiro e desmanche com certificação 'green' bem como a necessidade de seguro e demais obrigações inerentes à operação com o casco em questão", continua.
No fim do email, o advogado afirma que espera manifestação da Marinha com "brevidade", para iniciar as tratativas e enviar uma equipe de especialistas para a vistoria do casco "o quanto antes".

Em resposta, Bahov recebeu uma resposta curta: "Acuso recebimento", escreveu o terceiro-sargento Leandro, lotado no gabinete do comandante da Marinha, almirante Marcos Sampaio Olsen.

Procurado pela reportagem, Bahov afirmou que a companhia saudita está disposta a realizar os procedimentos para evitar o afundamento da embarcação.

"O problema principal, que é o rasgo no casco, tem como solucionar. Podemos enviar um mergulhador, se não der você manda para um dique seco. Dá até para enviar um navio-plataforma, que afunda e coloca o porta-aviões no bojo. O que não dá é afundar um navio desses, com quantidade de material perigoso que tem a bordo, como o amianto e outros produtos químicos que foram declarados no inventário", disse o advogado.

Ele acrescentou que o grupo saudita tem interesse econômico no porta-aviões, com o desmanche das peças, além de o casco representar um ativo para quem o adquirir.

"É a maior embarcação de guerra do Atlântico. É um navio grande, de desenho bonito, que tem história. Ele participou de testes nucleares quando ainda era bandeira francesa. Há uma questão de empoderamento também em adquirir algo histórico como o porta-aviões."

O porta-aviões São Paulo tem 266 metros de comprimento. Seu armamento era composto de três lançadores duplos de mísseis e metralhadoras de grosso calibre.

Inutilizado há décadas, o navio passou por um desmanche na França. Na década de 1990, ele chegou a passar por um processo de desamintação, que retirou 55 toneladas do produto tóxico.

Mesmo assim, o amianto ainda está presente nas paredes do porta-aviões --a substância era usada como isolante térmico e acústico, para reduzir o barulho da decolagem das aeronaves para a tripulação.

O porta-aviões foi vendido pela Marinha ao estaleiro turco Sök Denizcilik and Ticaret Limited, especializado em desmanche de navios. O veículo deixou o Brasil no dia 4 de agosto, em viagem que gerou protestos pelo mundo e foi monitorada em tempo real pelo Greenpeace.

A Marinha diz que, após a decisão de desmobilizar o porta-aviões, optou pela venda do casco para "desmanche verde", um processo de reciclagem segura para o qual o estaleiro turco Sök é credenciado e certificado.

Mas, diante de denúncias sobre a exportação ilegal de amianto, o governo turco revogou autorização para entrada da embarcação no dia 26 de agosto, quando o navio se aproximava do Estreito de Gilbraltar, em viagem feita com o auxílio de um rebocador.

A decisão atendeu a denúncias de organizações como o Greenpeace e a ONG Shipbreaking Platform, que protestavam contra o recebimento do navio.

Análises feitas pela ONG Shipbreaking em um porta-aviões gêmeo ao São Paulo identificou 760 toneladas de amianto na embarcação. Diante disso, a organização passou a questionar se, de fato, o casco enviado pelo Brasil teria as 10 toneladas da substância tóxica como previsto no inventário.

Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) suspendeu a licença de exportação e determinou o retorno do navio ao Brasil.

Em águas brasileiras, os rebocadores turcos deixaram o casco do porta-aviões e a Marinha voltou a assumir o controle da embarcação.
O relatório de uma perícia técnica da Marinha realizada na embarcação em 13 de janeiro constatou rasgos no casco, aumento no nível de alagamento e corrosão.

Pode ser constatado o aumento crítico da degradação da segurança do casco, quer seja pela perda das condições de flutuabilidade, quer seja pela perda irreversível da estabilidade mínima em avaria para navegação em mar aberto, além do aumento da extensão da avaria do casco", alertam os técnicos, em documento obtido pela Folha de S.Paulo.

Até meados de janeiro, cerca de 2.787 metros cúbicos de água entraram no casco. O limite para navegação em segurança é de 3.530 metros cúbicos.

"É possível afirmar que se pode garantir a segurança da navegação até que se chegue ao limite ora estabelecido de embarque de mais 743 m³ de água, prevista para acontecer, nas melhores hipóteses, em, no máximo, quatro semanas", adverte.

Sem empresas no Brasil para realizar o desmanche verde previsto no contrato e com o imbróglio com a empresa turca, a Marinha planejava o afundamento controlado da embarcação.

A técnica utilizada envolveria uma série de explosões para abrir rasgos no casco, o que levaria ao oceano também as mais de nove toneladas de amianto presentes na embarcação.

CÉZAR FEITOZA, RICARDO DELLA COLETTA E CATIA SEABRA / FOLHAPRESS

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