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Como confirmar o coronavírus como acidente de trabalho? Especialistas explicam decisão



Está suspensa desde o dia 29 de abril a Medida Provisória 927/2020 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que flexibilizou as leis trabalhistas durante a pandemia da Covid-19 considerando a infecção pelo vírus no ambiente de trabalho como doença ocupacional. No entanto, a proliferação do coronavírus é rápida e pode acontecer em qualquer local, por isso é difícil dizer se o profissional realmente contraiu a doença no espaço laboral. 

A decisão é válida em todo o território nacional, mas isso não significa que todo trabalhador que seja eventualmente contaminado possa se valer disso, foi o que explicou o advogado Pedro Vinicius do escritório Freitas e Franco. “Vai depender da atividade desenvolvida, por exemplo, quem trabalha na área de saúde, a exposição está relacionada diretamente ao trabalho, diferente de quem está em teletrabalho”.

Para ter direito é preciso entender, que com muitas atividades paralisadas, especialmente de comércio e indústrias, algumas categorias que são consideradas essenciais, como saúde e órgão públicos, é necessário estar de acordo com as medidas restritivas com fornecimento de equipamentos de proteção individual (EPI). 

“As categorias desse entendimento podem ser aplicadas em empresas que estejam mantendo atividade tanto em descumprimento dos decretos de fechamento ou mesmo autorizadas a permanecer em atividade não fornecer os equipamentos como luvas e máscaras, por exemplo. Deve-se analisar cada caso em particular”, disse Pedro.

O número de notificações é bem maior que o número de casos confirmados no país, com isso, a validade para dar entrada ao benefício será apenas com testes positivos. “Em razão da dificuldade em comprovar onde e quando se adquiriu a doença, foi que a prova deve ser do empregador, que deve comprovar que tomou todos os cuidados necessários para a proteção do empregado”. 

O benefício previdenciário a partir do 16⁰ dia de afastamento tem a garantia da estabilidade provisória o auxílio acidente acidentário, pelo período em que consistir a doença. 

Para o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA), Luís Carneiro Filho foi uma decisão acertada do STF. “Passou a mensagem de que a pandemia não autoriza o jogo de vale tudo, isto é, o empregador é obrigado a adotar todas as medidas necessárias à redução dos riscos inerentes ao trabalho, no caso específico, as medidas de contenção da propagação do vírus  da COVID-19 no ambiente laboral, implementando medidas sanitárias mais restritivas e investir em segurança e saúde, sob pena de responsabilização pela contaminação do empregado e caracterização do acidente de trabalho”. 

Luís explicou pontos polêmicos e importantes para quem precisar aplicar o benefício na prática. Confira a entrevista: 

Repórter: O STF aprovou que o coronavírus pode ser considerado acidente de trabalho. Pela facilidade de contágio será difícil comprovar o contato com o vírus tenha sido na atividade da empresa. Como será essa triagem? 

Luís: É preciso esclarecer que a decisão liminar, proferida pelo Supremo Tribunal Federal, não estabeleceu a premissa de que todo contágio de trabalhador pela COVID-19 será considerado como acidente de trabalho (doença ocupacional).

A decisão suspendeu a eficácia do art. 29, da Medida Provisória nº. 927, que estabelecia a presunção da natureza ocupacional da contaminação do trabalhador pela COVID-19.  Com a decisão do STF, suspendendo a eficácia do art. 29 , passamos a observar o regime jurídico legal existente, anterior à edição da MP 927, no que toca à configuração, ou não, do acidente de trabalho.

Nesse cenário,  o art. 20, §1º, “d”, da Lei nº 8.213/90 (Lei que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social), estabelece que a doença endêmica - como se enquadra a pandemia da COVID-19 -, apenas  será considerada como doença do trabalho se houver comprovação de que o contágio é resultante de exposição do trabalhador ou contato direto com o vírus em virtude da natureza da atividade do empregado.

Assim, para se estabelecer se a contaminação do trabalhador pela COVID-19 é considerada acidente de trabalho, deverá ser observada, dentre outras questões, a natureza da atividade desenvolvida pelo empregado, a existência de risco acentuado, ou não, de contaminação em razão da natureza do trabalho executado (citamos como exemplo os profissionais da área da saúde), bem como se o empregador adotou todas as medidas sanitárias e de prevenção ao contágio determinadas pelos órgãos de controle. Em caso de inércia ou negligência do empregador em implementar as medidas de contenção da contaminação do ambiente de trabalho, é possível haver o enquadramento do adoecimento pela COVID-19 do trabalhador, como acidente de trabalho. 

Podemos citar dois casos extremos.

O primeiro exemplo, um profissional da área da saúde, que labore na linha de frente de atendimento em um hospital referenciado da COVID-19. Nesses casos, em razão do risco acentuado de contaminação, decorrente da própria atividade desenvolvida pelo empregado, há a presunção de que a contaminação ocorreu no ambiente do trabalho, devendo o empregador emitir a CAT. 

Por outro lado, e em outro extremo, vejamos um trabalhador que se encontra executando suas atividades em regime de teletrabalho. Nesse caso, deverá haver a comprovação de que o contágio decorreu do exercício da atividade desenvolvida, o que requer um esforço probatório muito maior.

R: Para você qual o efeito prático dessa decisão?

L: Com a decisão, o STF passou a mensagem de que a pandemia não autoriza o jogo de vale tudo, isto é, o empregador é obrigado a adotar todas as medidas necessárias à redução dos riscos inerentes ao trabalho, no caso específico, as medidas de contenção da propagação do vírus  da COVID-19 no ambiente laboral, implementando medidas sanitárias mais restritivas e investir em segurança e saúde, sob pena de responsabilização pela contaminação do empregado e caracterização do acidente de trabalho. Mandou muito bem o STF nesse sentido.

Na prática, demonstrando o empregado que houve o contágio no ambiente de trabalho, seja pela ausência de medidas efetivas de proteção implementadas pelo empregador, seja em razão da própria natureza da atividade desenvolvida, que implicar potencial risco de contaminação, o empregado terá assegurado o auxílio doença acidentário, beneficiando-se do recebimento do valor do benefício, o recolhimento do FGTS durante o período de afastamento, bem como a estabilidade provisória no emprego de 1 ano após a alta previdenciária.

Não considerar a COVID como doença ocupacional, por outro lado, retiraria uma importante garantia do trabalhador, que é a estabilidade no emprego em tempos de crise econômica e de extrema vulnerabilidade social. É uma decisão acertada, do ponto de vista jurídico e social.

Por outro lado, a decisão do STF suspendeu ainda a eficácia do art. 31 da MP 927 que afastava a fiscalização do trabalho e a autuação dos Auditores Fiscais do Trabalho, no período de 180 dias contados da data da vigência da MP, permitindo apenas uma fiscalização orientativa, isto é, em outras linhas, vedada a imposição de multas e de aplicação de sanções administrativas.

A MP 927, nesse aspecto, havia restringido a fiscalização trabalhista apenas a casos de violações gravíssimas, como trabalho infantil, trabalho análogo ao de escravo e acidentes fatais, para citar alguns exemplos.

Com a suspensão da eficácia do art. 31 da MP 927, pela decisão do Supremo, esse poder fiscalizatório foi restaurado, podendo os Auditores Fiscais do Trabalhado atuar e autuar como vinham fazendo. 

É bom destacar que, nesse cenário de extrema vulnerabilidade social que estamos vivendo existe uma necessidade ainda maior de fiscalização pelos órgãos de controle e a MP tinha mitigado o poder de fiscalização. 

R: Tendo em vista este rigor do decreto, devem acontecer alterações nos ambientes de trabalho para que se assegure a legalidade e não contaminação do trabalhador? 

L: Sim. Certamente. Diante desse cenário de contaminação comunitária pelo vírus, sendo o ambiente de trabalho local de natural aglomeração e circulação de pessoas, as empresas devem adotar as medidas sanitárias mais restritivas e a implementação de ações específicas para a contenção da disseminação do vírus.

Dentro desse contexto, cabe ao empregador adotar as medidas de organização do trabalho e de proteção coletiva, visando a minorar os riscos de contaminação, como a redução da jornada de trabalho, para diminuir o tempo de exposição ao vírus, viabilizar, sempre que compatível, o exercício da atividade em teletrabalho, conceder treinamento específico abrangendo as medidas de prevenção à contaminação pela COVID-19, conceder e fiscalizar do correto uso dos equipamentos de proteção individual, elaborar e executar o Plano de Contingenciamento, dentre outras medidas sanitária e de saúde necessárias.

Ainda, necessário mencionar que o empregador é um importante agente difusor de informações acerca da prevenção, das medidas de autocuidado que os empregados deverão observar, como a higienização constante das mãos, o uso do álcool a 70º e a observância do necessário distanciamento entre trabalhadores e consumidores/pacientes durante a jornada de trabalho.

Importante que a empresa, ao identificar o caso nº 1 de contaminação no ambiente de trabalho, afaste o trabalhador para quarentena, e os seus contatos próximos, notificando imediatamente a Vigilância Sanitária. O SESMT das empresas deve ainda comunicar à Vigilância Sanitária os casos de afastamento por suspeita ou confirmação de diagnóstico de COVID  e se submeter às medidas sanitárias impostas pelos decretos e outras medidas, se necessárias, para evitar a exposição dos outros empregados. Ficar inerte ou não adotar as medidas necessárias, pode fazer o preposto da empresa incidir na conduta prevista no art. 268 do Código Penal, ou seja, com sua conduta permitir a propagação do vírus.

RAqui na Bahia, como será para funcionar essa medida? O que o trabalhador vai precisar fazer para comprovar e ter direitos?

L: É necessário estar atento e cumprir as medidas de autocuidado, de prevenção ao contágio da COVID-19, notadamente o distanciamento social no ambiente de trabalho, uso correto dos EPIs, observância das medidas de proteção coletiva, dentre outras ações, afinal é responsabilidade também do empregado cumprir as determinações do empregador acerca das normas de saúde e segurança.  Por outro lado, a comprovação da natureza acidentária da COVID-19 será feita de forma casuística, caso a caso, a depender da natureza da atividade desempenhada pelo empregado, do grau do risco de contaminação que a atividade implica e da observância do ambiente de trabalho, se houve ou não, pelo empregador, a implementação das medidas sanitárias e de saúde necessárias. 

É importante o empregado estar em constante contato com a CIPA e o SESMT da empresa, a fim de estabelecer uma via de comunicação efetiva a respeito do protocolo de segurança adotado pela empresa.  /Por: José Cruz/ Agência Brasil 
 

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