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Portugal quer processar grife americana que copiou design de agasalho tradicional

 


O governo de Portugal anunciou que está estudando alternativas judiciais contra a grife americana Tory Burch. A marca, criada pela estilista de mesmo nome, foi acusada de vender, como se fosse uma criação própria, uma peça de fabricação tradicional lusa.

A chamada camisola poveira é um dos ícones do artesanato da cidade de Póvoa de Varzim, região pesqueira no Norte do país, e está em processo de certificação internacional. A peça é feita de lã grossa oriunda da Serra da Estrela e decorada, usando um marcante bordado avermelhado, com motivos alusivos ao mar, como peixes e caranguejos.

Detalhe importante: camisola, em Portugal, tem um significado diferente do Brasil. No português lusitano, camisola é uma espécie de agasalho , uma blusa de manga longa.

Algo muito próximo ao inconfundível casaco lusitano estava disponível no site da marca como se fosse uma criação original. Além de não haver nenhuma menção a Portugal, a descrição do artigo ainda dizia que o design era inspirado na região de Baja, no México.

Há vários detalhes da peça, no entanto, que tornam insustentável a alegação de inspiração mexicana.

Além de ter todas as características originais da Póvoa de Varzim, como os motivos ligados ao mar e à pesca bordados em ponto-cruz, o sweater tem ainda o símbolo da família real portuguesa.

A coroa da monarquia portuguesa –que nunca foi exatamente popular em terras mexicanas– está estampada bem no peito da blusa.

No site da estilista americana, a peça, que tem design centenário e foi tradicionalmente usada por pescadores, era vendida por 695 euros (cerca de R$ 4.715): entre nove e dez vezes o valor normalmente praticado pelas artesãs locais.

Polêmica
A história veio à tona após uma publicação de um político da cidade.

Em entrevista ao jornal Público, Ricardo Silva contou que ficou sabendo do caso através de um conterrâneo. Ele diz ter entrado em contato com a grife por e-mail e pelas redes sociais, mas que não obteve resposta.

“É fácil para uma marca internacional apropriar-se selectivamente de peças tradicionais, que incluem nas suas colecções a dez vezes o preço praticado pelas artesãs. Uma coisa é utilizar motivos decorativos ou a estrutura da malha, outra é fazer uma cópia sem sequer assumir o nome da peça ‘camisola poveira’ de Portugal. Bastava isso”, afirmou.

Após a publicação da reportagem inicial, vários portugueses invadiram as redes sociais da Tory Burch com reclamações.

Inicialmente, a grife não prestou declarações e manteve o casaco à venda no site,  removendo, no entanto, a alegação de que a peça seria de inspiração mexicana.

Com o aumento da repercussão, inclusive em sites de moda internacional, a Tory Burch acabou se pronunciando.

Em nota publicada nas redes sociais, a criadora da marca deixou uma nota –repleta de erros de português– classificando o episódio como um erro e pedindo desculpas pelo ocorrido.

“Foi um erro não termos feito referência ás bonitas e tradicionais camisolas de pescador tão representativos da cidade da Póvoa de Varzim” (sic), afirmou.

Segundo Tory Burch, a marca estaria em negociações com a Câmara Municipal (prefeitura) da cidade para melhor apoiar as artesãs da cidade.

Parecia que o caso iria se encerrar por aí, mas o governo português decidiu não deixar a história passar em branco.

Em nota, o ministério da Cultura afirmou que já está buscando alternativas judiciais e extra-judiciais para responsabilizar a marca pelo que chamou de apropriação abusiva da cultura portuguesa.

“Após ter tomado conhecimento das suspeitas de uma eventual apropriação abusiva de um importante patrimônio imaterial português – a camisola poveira – o governo está determinado em agir em conformidade na proteção deste saber fazer português”, diz o texto.

“O governo, tendo comunicado a sua intenção à Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, fará o que estiver ao seu alcance para que quem já reconheceu publicamente o seu erro não se demita das suas responsabilidades e corrija a injustiça cometida, compensando a comunidade poveira”, finaliza.

Em meio às polêmicas, vários portugueses esmiuçaram o site da grife e descobriram que há mais semelhanças com o design tradicional do país. Na linha de utensílios para casa da Tory Burch, há peças de cerâmica inspiradas em vegetais, sobretudo couves.

Pratos e baixelas com couves decorativas são justamente a marca registrada de uma das mais famosas marcas portuguesas: a Bordallo Pinheiro.

Nas redes sociais, a marca aproveitou para ironizar o caso.

Folhapress

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