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Congresso propõe uma nova lei por semana para regular trabalho em app


 A pandemia da Covid-19 e a pressão de motoristas e entregadores levaram deputados e senadores a intensificar esforços para tentar regular atividades em aplicativos e plataformas digitais.

Já são 64 iniciativas sobre o tema no Congresso. Apenas neste ano, foram apresentadas 36 propostas para criar uma rede de proteção ao número cada vez maior de trabalhadores que recorrem a essas atividades como fonte única ou complementar de renda durante a crise.

O volume representa, em média, uma iniciativa por semana. Na comparação com o ano passado, quando foram protocolados 26 textos, o aumento foi de 38,5%. Em 2018, foram somente dois projetos.

Quando se analisa a data de apresentação, percebe-se o efeito do "breque dos apps" –manifestações realizadas por entregadores em julho para reivindicar taxas mais justas e ajuda com itens de proteção.

No intervalo de 14 dias, de 26 de junho a 10 de julho, ápice do movimento de contestação à política das empresas, foram apresentados dez projetos de lei.

Os dados foram levantados pela Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho), que compilou as ideias esparsas e formulou um único anteprojeto de lei a ser levado aos parlamentares.

"Entrou no nosso radar essa avalanche de propostas para trabalhadores 4.0, do século 21", diz Noemia Porto, presidente da Anamatra. O anteprojeto trata de um código de trabalho por plataformas digitais.

A tarefa é árdua. Magistrados, MPT (Ministério Público do Trabalho), trabalhadores, empresas, congressistas e especialistas não se entendem. Porém, ganha força a corrente que defende proteção social.

Os atuais projetos abordam temas diversos. Há propostas que exigem curso preventivo e de reciclagem, estabelecem instalação de câmeras e botão de pânico, e limitam em 10% ou 15% a comissão para o aplicativo. Hoje, a alíquota de algumas empresas é de 25%.

Outros textos cobram justificativa para sanções a condutores, definem a Justiça do Trabalho para julgar ações contra plataformas e ao menos quatro reconhecem vínculo de emprego.

"Hoje os entregadores estão pedindo o que os trabalhadores pediam no século 19. O que propomos são modalidades diversas de contratação, ora com vínculo, ora como autônomo, mas com o mínimo de direito trabalhista", diz Porto.

A discussão ultrapassa fronteiras. Na Califórnia, além de escolher o presidente dos EUA, eleitores foram às urnas na última terça (3) para, em referendo, definir se motoristas de apps devem trabalhar sem vínculo. Ficou decidido que sim.

Por aqui, um dos projetos com mais chances de ser votado está quase perdendo a eficácia. O texto exige proteção a entregadores e usuários de delivery na pandemia. A calamidade pública, porém, expira em 31 de dezembro.

À proposta do deputado Israel Batista (PV-DF) foram anexados projetos de outros congressistas. Um deles, do deputado Ivan Valente (PSOL-SP), estabelece medidas para prevenir riscos à saúde de entregadores e clientes, como pagamento remoto, preferencialmente, e fornecimento de equipamentos de proteção individual.

"É um projeto para minorar as péssimas condições que pioraram na pandemia com o aumento da concorrência", diz Valente. "Com o desemprego, se você tem uma moto, você se cadastra no aplicativo."

O texto exige que a empresa ofereça seguro contra acidentes e por infecção por doença contagiosa. Prevê ainda assistência financeira durante afastamento por acidente ou contaminação por coronavírus.

O projeto deixa de fora questões trabalhistas. "A ideia foi facilitar a tramitação e a aprovação, levantar a exploração que está havendo. [O aplicativo] Cria uma ilusão de empreendedorismo, mas o trabalhador é explorado."

Valente espera a aprovação após as eleições municipais. Para ele, a iniciativa vai estimular a formulação de propostas para uma regulação permanente, como pretende a Anamatra.

Relator da proposta, o deputado Fábio Trad (PSD-MS) discorda e destaca o caráter temporário. "Se for renovado o período excepcional [da calamidade], a tendência é óbvia no sentido de que vamos renovar também a vigência do projeto, se aprovado."

Segundo Trad, não há resistências para votação. "Não há, no projeto, nada que interfira na livre iniciativa, nas leis do mercado. Apenas há uma preocupação em se proteger normativamente os entregadores neste momento, porque eles estão à margem de legislação protetiva", diz.

Há propostas, no entanto, que buscam regulamentar relações trabalhistas entre apps e entregadores, como a do deputado Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde.

O texto propõe mudar a lei da política nacional de mobilidade urbana para exigir que se comprove que as empresas não adotam medidas de estímulo e metas que incentivem jornadas de trabalho excessivas.

O pesquisador do Ibre/FGV e da consultoria Idados Bruno Ottoni também advoga por mais direitos a motoristas e entregadores. "Hoje tem proteção zero, e é importante oferecer proteção para o indivíduo".

No entanto, o especialista em mercado de trabalho adverte para o risco de se regulamentar em excesso uma atividade que tem como combustível a inovação. "Aplicativo é uma tendência que veio para ficar. Precisa ser cuidadoso para não ter legislação burocrática que venha a inibir a livre iniciativa", diz.

A argumentação encontra eco em alas no Congresso.    /Por: Agência Brasil 

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