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Idoso morto em porta de delegacia queria registrar a perda de seu documento


O aposentado Valdecir de Jesus, de 62 anos, acordou nesta sexta-feira com um compromisso na cabeça: registrar na 5ª DP (Gomes Freire) a perda de sua carteira de identidade. Estava há dois dias sem o documento, e achou melhor ir ainda pela manhã à delegacia. Preferiu resolver o problema “à moda antiga”, rejeitando a proposta de um filho de fazer o processo pela internet. De viagem marcada para São Paulo, queria ter logo uma cópia de um boletim de ocorrência, para apresentá-lo na hora de embarcar caso não conseguisse tirar uma segunda via a tempo. Preocupado, não prestou atenção quando alguém, dentro da unidade policial, gritou para que não entrasse. Valdecir puxou a porta e tomou um tiro no peito, caindo do lado de fora. Morreu com uma carteira do Sindicato dos Empregados e Trabalhadores da Estiva nas mãos, com a qual pretendia comprovar quem era.
Além do antigo estivador, três pessoas foram baleadas, inclusive o homem que abriu fogo na direção de Valdecir. O ex-soldado da Polícia Militar do Rio Grande do Norte Jefferson Perceu Maciel Saraiva havia sido preso uma hora antes, depois de quebrar, com a cabeça, uma porta de vidro do Aeroporto Santos Dumont. Foi levado algemado à 5ª DP por uma equipe do programa Aterro Presente, e, para assinar o boletim da ocorrência, um PM teve de soltar suas mãos . Em seguida, Jefferson tomou sua pistola.
Jefferson atirou duas vezes contra o chefe de segurança da Infraero Marcos Freire, que o conteve no aeroporto até a chegada da equipe do Aterro Presente. Errou o alvo, e acabou atingindo, primeiramente, Francisco Luiz Xavier, que, assim como Valdecir, tinha ido à delegacia fazer um registro. O estivador aposentado foi baleado logo depois.
Mesmo ferido, Francisco correu para fora da 5ª DP, e caiu no asfalto da Rua Gomes Freire. Jefferson ainda tentou matar o delegado que registrava sua prisão, mas errou de novo e baleou o policial civil Nadmar Junger antes de cruzar a porta. Em seguida, roubou uma motocicleta para fugir, mas levou um tiro na cabeça, provavelmente disparado por um PM que chegava com colegas ao local. Foi hospitalizado em estado grave.
Uma testemunha da ação contou que Jefferson estava “perturbado, agressivo” no momento em que um policial tirou suas algemas.
— Ele pediu para ler o registro da prisão. Nesse momento, um dos PMs do Aterro Presente consentiu e tirou as algemas. O rapaz, então, começou a ler o documento em voz alta, e bem devagar. Estava estranho. De repente, arrancou a arma do PM e atirou duas vezes em direção ao funcionário da Infraero que o conteve durante o surto no aeroporto. O segurança nasceu de novo. O bandido estava a menos de quatro metros, e errou o alvo — contou a testemunha, que pediu para não ser identificada.
Procurado por um vizinho que viu o corpo na porta da delegacia, um dos cinco filhos de Valdecir correu para o local. Caiu em prantos ao ver o pai morto. No Instituto Médico-Legal (IML), no Centro da cidade, a viúva lembrava a todo momento que o aposentado se recusou a registrar a perda da carteira de identidade pela internet.
— Valdecir era teimoso, e gostava de fazer tudo certinho. Por isso, preferiu ir à delegacia para registrar a perda da carteira de identidade, queria se certificar de que não haveria erro. A gente não merecia isso.

Histórico de problemas

Não foi a primeira vez que Jefferson surtou dentro de uma delegacia. Começou a dar sinais de desequilíbrio quando trabalhava como PM na cidade potiguar de São Miguel do Gostoso. Não se conformava de ter sido abandonado: em 18 de fevereiro de 2014, foi acusado de tentar matar, a tiros, a namorada de sua ex-mulher.
Depois, foi denunciado por invasão a uma residência. Ele se apresentou a uma delegacia para prestar depoimento e, segundo seu advogado, Luiz Henrique de Araújo Diniz, teve uma nova crise:
— Uma delegada o mandou entregar uma arma, e, quando se virou virou para ligar um computador, ele saltou um balcão e fugiu. Roubou dois veículos e foi parar na casa de um parente em Recife. Não sei como conseguiu chegar até lá. Foi diagnosticado como esquizofrênico paranoide pelo departamento médico da Polícia Militar do Rio Grande do Norte. Acabou condenado a dez anos por tentativa de homicídio, e passou três anos internado numa instituição psiquiátrica — contou o advogado.
Enquanto Jefferson abria fogo na 5ª DP, a mãe dele, a professora Aparecida Maciel, participava de uma missa em celebração ao lançamento de seu livro “A vitória pela fé”, no qual narra as dificuldades que enfrentou para cuidar do filho.
Jornal Extra

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